domingo, novembro 02, 2008

Opinião: "União Europeia versus Estado"

"SOLIDARIEDADE FINANCEIRA: AS DIFERENÇAS
A propósito da proposta de lei das finanças regionais, muito se tem falado da diminuição de fundos da União Europeia (U.E.) para a Madeira. Tem-se dito que ao fim e ao cabo, o Governo da República não faz mais do que seguir as pisadas da U.E. Ora a atitude do Governo da República e a da U.E. não são minimamente comparáveis. Importa por isso que ponhamos em evidência as diferenças. Na prática europeia, há muitos anos que está estabelecida a regra, segundo a qual, as Regiões que por força do seu desenvolvimento económico e social, ultrapassam o plafond de 75% da média europeia em termos de PIB/per capita, perdem o direito a serem consideradas regiões prioritárias para efeito de atribuição dos fundos estruturais comunitários. E apesar de este critério fazer de há muito parte das regras do jogo, prevê-se, com o objectivo de evitar uma perda abrupta dos fundos, um regime de transição ao longo da vários anos em que a diminuição vai gradualmente ocorrendo. Acontece até que a Madeira, como resultado duma boa negociação, obteve da U.E., tendo em conta a sua condição ultraperiférica, um regime muito especial de transição, que lhe permitiu limitar as perdas de fundos estruturais a cerca de 40%, quando a maioria das outras Regiões com um PIB equivalente ao da Madeira registaram perdas na ordem dos 75%. Nenhuma Região fez melhor negociação que a da Madeira!
Importa também referir que a U.E. tem consciência das limitações do critério do PIB para determinar o nível de desenvolvimento duma Região. Por ocasião da aprovação dos novos regulamentos dos Fundos Estruturais a vigorar no período 2007-2013, muito se discutiu a eliminação do critério do PIB ou a sua conjugação com outros critérios (nível de desemprego, qualificação da mão-de-obra, poder de compra etc.). Acabou por se concluir, que seria uma intolerável falta de ética e um tremendo defraudar de expectativas, alterar o critério do PIB, no preciso momento em que este beneficiaria a grande maioria das Regiões dos países acabados de entrar na U.E. na sequência do grande alargamento de Maio de 2004 e que apresentavam níveis de PIB muito baixos. CLAREZA, PREVISIBILIDADE, ESTABILIDADE, RSPEITO PELA CONFIANÇA E EXPECTATIVA DAS REGIÕES, LEGALIDADE E NÃO DISCRIMINAÇÃO, são valores que reesaltam no relacionamento da U.E. com as suas Regiões.
Têm estes mesmos valores pautado a actuação do Estado no contexto da revisão da lei das finanças regionais? A resposta é infelizmente um rotundo NÃO. Na verdade, o Governo da República, sem diálogo prévio com a Madeira e sem nada que o fizesse prever, altera brutalmente, de um ano para o outro, as regras do jogo. Viola grosseiramente os princípios da previsibilidade, estabilidade e legalidade, já que nada no programa do Governo da República apontava nesse sentido, a que acresce o facto de o Estatuto Político garantir à região, em cada ano, transferências financeiras não inferiores ao ano anterior. Face a um corte inesperado já em 2007 de 34 milhões de euros, a que se seguirão nos anos seguintes cortes ainda mais acentuados, como irá a Região fazer face aos compromissos assumidos? Com este comportamento eivado de uma irresponsabilidade política e institucional que custa a acreditar, defrauda-se igualmente legítimas expectativas de agentes políticos, económicos e sociais e destrói-se duma forma inimaginável o valor da CONFIANÇA, o qual é de importância crucial para o funcionamento duma sociedade moderna e próspera.
Mas o Governo da República viola também o princípio da igualdade ao favorecer os Açores face à Madeira. Eu até compreendo uma lógica de discriminação positiva dos Açores, face à maior distancia e número de ilhas e a um inferior nível de desenvolvimento desta Região. Mas não compreendo uma discriminação positiva manifestamente desproporcionada e em alguns casos até arbitrária, como é por exemplo a situação dos investimentos previstos do Estado nos Açores em 2007, cinco vezes superior ao projectado para a Madeira.
Face a esta actuação do Governo da República, é legitimo formar a suspeição de que o que acima de tudo faz mover o primeiro-ministro socialista é o propósito político-partidário de em 2008 assegurar a manutenção do Governo socialista nos Açores e derrubar o Governo social-democrata na Madeira. E para este fim tudo vale deste a instrumentalização do Estado e do dinheiro dos contribuintes. Só a esta luz se entende a utilização do critério do PIB na proposta de lei das finanças regionais. Ao contrário da U.E., o Governo da República não tinha qualquer condicionamento de ordem ética para adoptar APENAS o PIB como o melhor índice de leitura do nível de desenvolvimento dos Açores e da Madeira. O Governo da República apesar de ter consciência das limitações do critério do PIB, utiliza-o porque assim melhor poderá beneficiar os Açores e prejudicar a Madeira. Acreditamos que Cavaco Silva não dará o seu aval a esta urdidura socialista". (Sergio Marques, DN do Funchal,Outubro de 2006)

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