quinta-feira, dezembro 20, 2007

... e solicita fiscalização das Incompatibilidades (II)

Quanto à decisão do Representante da República de solicitar ao Tribunal Constitucional a apreciação preventiva da constitucionalidade das normas constantes do diploma regional intitulado "Regime de Execução das Incompatibilidades e Impedimentos dos deputados da Assembleia Legislativa", Monteiro Diniz fundamenta a opção tomada, destacando-se a seguinte passagem:
"Na decorrência do artigo 227º, nº 1, alínea a) da Constituição, as regiões autónomas têm o poder, a definir nos respectivos estatutos de “legislar no âmbito regional em matérias enunciadas no respectivo estatuto político-administrativo e que não estejam reservadas aos órgãos de soberania”, acrescendo que, nos termos do artigo 228º, nº 1, do texto constitucional, “a autonomia legislativa das regiões autónomas incide sobre as matérias enunciadas no respectivo estatuto político-administrativo que não estejam reservadas aos órgãos de soberania”, sendo que, por força do artigo 46º da Lei Constitucional nº 1/2004, de 24 de Julho, até à eventual alteração das disposições dos estatutos politico-administrativos das regiões autónomas, prevista na alínea f) do nº 6 do artigo 168º, o âmbito material da competência da Região Autónoma da Madeira é o constante do artigo 40º do respectivo Estatuto Politico-Administrativo.
Nesta conformidade, importará averiguar se a matéria que constitui objecto do diploma sob sindicância relativa ao “Regime de execução das incompatibilidades e impedimentos dos deputados à Assembleia Legislativa da Madeira” se encontra ou não reservada à competência própria dos órgãos de soberania, maxime, à competência legislativa da Assembleia da República, pois que, a assim ser o parlamento regional ao aprovar a normação em causa invadiu a esfera própria e reservada do parlamento nacional.
Ora, já anteriormente houve ensejo de se assinalar que o estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas — desde logo os deputados às assembleias legislativas — é definido nos respectivos estatutos político-administrativos (artigo 231º, nº 7), devendo estes ser aprovados pela Assembleia da República, embora mediante iniciativa das assembleias legislativas das regiões (artigo 226º).
E, como se decidiu no já citado Acórdão nº 637/95, “a Constituição exige que o estatuto desses titulares de órgãos de governo próprio [os deputados às assembleias legislativas das regiões], se ache definido no Estatuto Político-Administrativo. Há, pois, uma reserva de lei estatutária na matéria. A definição desse estatuto tem de abranger os deveres, as responsabilidades e incompatibilidades desses titulares, bem como os respectivos direitos, regalias e imunidades”.
Deste modo, acompanhando o entendimento assumido no também citado Acórdão nº 382/2007, deverá concluir-se que a matéria das incompatibilidades [e dos impedimentos] faz parte integrante do estatuto dos deputados às assembleias legislativas das regiões.
À luz do exposto, tendo-se adquirido que a definição do estatuto dos deputados às assembleias legislativas das regiões autónomas é da competência da Assembleia da República a coberto da alínea b) do artigo 161º, por ser matéria a definir nos correspondentes Estatutos Político-Administrativos e outrossim que a matéria das incompatibilidades e impedimentos haveria de integrar necessariamente esse estatuto porque as normas em apreço traduzem alterações ao regime das incompatibilidades e impedimentos constante do Estatuto Político-Administrativo em vigor, impõe-se concluir que tais normas sofrem do vício de inconstitucionalidade.
Como do mesmo modo a norma do artigo 4º do diploma em apreço, quando atribui ao Tribunal Constitucional competência para servir de depositário de declarações ali apresentadas pelos deputados à Assembleia Legislativa, cometendo-lhe ainda competência para proceder à análise e fiscalização das declarações dos deputados, invade manifestamente a reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República à qual pertence, em exclusivo, legislar sobre “organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional” [artigo 164º, alínea c)].
Com efeito, a matéria versada em todos os artigos do diploma em apreço (o que rege sobre o início da vigência é, dos demais, meramente instrumental) independentemente de representar ou não alteração material ao actual regime das incompatibilidades e impedimentos dos deputados à Assembleia Legislativa, — e em parte nela se contêm diversas alterações — nunca poderia validamente ser objecto de um decreto legislativo regional.
A conformidade constitucional de semelhante intento dependia do respeito pelo procedimento legislativo próprio da alteração dos estatutos politico-administrativos regionais, designadamente da assumpção do “momento impulsivo” através da apresentação do correspondente projecto nos termos dos nºs 1 e 4 do artigo 226º da Constituição, possibilitando-se depois o “momento deliberativo” reservado à Assembleia da República.
Não tendo sido adoptada a via constitucionalmente traçada e imposta para a introdução de alterações nos estatutos político-administrativos das regiões autónomas torna-se imperioso o reconhecimento da inconstitucionalidade de todas as normas do diploma em apreço.
Do que vem de se expor, poderá concluir-se que todas as normas do decreto em apreço por ultrapassarem o âmbito da competência legislativa da Assembleia Legislativa, violando as normas dos artigos 161º, alínea b), 231º, nº 7, 164º, alínea c), 227º, nº 1, alínea a) e 228º, nº 1, todas da Constituição, se encontram feridas do vício de inconstitucionalidade orgânica".

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