terça-feira, abril 09, 2024

Madeira: “importância da estabilidade” pode salvar Albuquerque no pós-eleições

Quando, a 26 de Janeiro, Miguel Albuquerque anunciou a sua demissão de presidente do Governo da Madeira, tudo se conjungava para que o PSD apresentasse um novo líder nas expectáveis futuras eleições regionais que o Presidente da República acabou por marcar para exactos quatro meses volvidos daquele dia. Albuquerque, arguido por suspeitas de corrupção, resistiu, mas não sem fracturar o partido que até então tinha na mão. No PS-M, Paulo Cafôfo, que em 2019esteve perto de conquistar o poder, também enfrenta divisões internas. A tendência da direita deverá embalar o PSD, que pode ser salvo no contexto pós-eleitoral pela necessidade de evitar três eleições regionais em menos de um ano.

"Tudo vai depender da força do PSD em termos de mandatos", afirma ao PÚBLICO a politóloga Teresa Ruel, que rejeita um cenário de ingovernabilidade a seguir às eleições sde 26 de Maio, apesar do desgaste associado à imagem de Miguel Albuquerque e de o processo judicial ter levado os partidos a aumentar o tom das críticas ao líder o PSD na Madeira.

Nas últimas semanas, por exemplo, o presidente do Chega na Madeira, Miguel Castro, tem vindo a repetir que o partido não está disponível para viabilizar um governo do PSD, em sintonia com as críticas contundentes de André Ventura a Albuquerque. Contudo, entre a retórica e a prática pode existir uma “zona cinzenta”, alerta Teresa Ruel, exemplificando com o caso dos Açores.

No arquipélago açoriano, onde também aconteceram eleições antecipadas, a abstenção o Chega foi decisiva na aprovação do programa do governo regional, mesmo não existindo um acordo formal e apesar de o partido ter exigido, sem sucesso, integrar o executivo. "Nos Açores, apesar de em termos de governabilidade não existir formalmente uma coligação, temos o Chega a validar uma governação", compara a docente do ISCSP.

O caso da viabilização do programa do governo açoriano — que, se não tivesse sido aprovado, implicaria a demissão do executivo — pode ser um balão de ensaio sobre o comportamento da direita na Madeira. A IL, que nos Açores rasgou o acordo que suportava o executivo regional e votou contra o Orçamento para 2024, também se absteve na votação do programa do novo governo de Bolieiro. "A IL e o Chega têm sido críticos, mas há sempre o argumento de que acima dos partidos está a Madeira e da importância da estabilidade".

Da parte do PSD-Madeira, tem existido uma mudança de posição quanto à política de alianças. Se há seis meses hesitava em relação ao Chega, Miguel Albuquerque insiste agora que não existem “linhas vermelhas” com nenhuma força política, classificando o partido de André Ventura como um "actor imprescindível no quadro político".

O regresso de Cafôfo

Estas eleições apanharam o PS-Madeira num processo de reorganização, depois da saída de Sérgio Gonçalves, que perdeu as eleições de Setembro do ano passado, e do regresso de Paulo Cafôfo, que conseguiu o melhor resultado de sempre dos socialistas em regionais. Em 2019, nas eleições mais renhidas da autonomia madeirense, o PSD perdeu a maioria absoluta pela primeira vez e o PS ficou a dois deputados dos sociais-democratas.

Se, por um lado, a candidatura de Cafofo pode acalentar a esperança de uma alternância no poder devido ao historial, por outro, também é certo que cinco anos depois o "contexto politico e partidário é completamente distinto". "Não podemos cair na falácia de que em circunstâncias diferentes o resultado será o mesmo", avisa a docente, natural da Madeira. Para já, os resultados para a Assembleia da República permitiram ao PSD cantar vitória.

Na Madeira, os sociais-democratas elegeram três deputados e aumentaram o número devotos face a 2019 e 2022, ficando em primeiro lugar, com 35,38%, acima do resultado nacional do partido. O PS, que apresentou como cabeça de lista Paulo Cafofo, ficou-se pelos 19,84%, perdeu dez mil votos e um deputado para o Chega.

Se em 2019 Cafôfo se apresentou a eleições embalado pela presidência da Câmara do Funchal, em 2024 aparece com danos na imagem devido à estratégia de querer conciliara candidatura à República com a da assembleia regional. Também não caiu bem junto do eleitorado a insistência de Cafôfo em manter-se simultaneamente como secretário de estado das Comunidades do Governo de António Costa e líder do PS-Madeira.

Além do socialista, também existem novidades face há seis meses na presidência do CDS-PP na Madeira, que vai a votos sozinho pela primeira vez desde 2019 numa altura em que ainda faz parte do executivo regional. O actual presidente da Assembleia regional, José Manuel Rodrigues, líder dos centristas madeirenses entre 1997 e 2015, é o único candidato à presidência do partido que corre o risco de desaparecer do parlamento.

Os outros partidos deverão manter os rostos das últimas eleições. No Juntos Pelo Povo (terceira força política na região) as fracturas internas que ficaram expostas no último acto eleitoral parecem saradas com os irmãos Élvio e Filipe Sousa a encabeçar a lista. No PAN, também marcado por divisões, a deputada Mónica Freitas, que assegurou a manutenção de Albuquerque no poder, vai agora a votos enquanto líder da estrutura regional.

Divisões no PS e PSD

Numa sondagem publicada no Jornal da Madeira a 13 de Março (quando Marcelo Rebelo de Sousa ainda não tinha convocado as eleições), o PSD elegeria 21 deputados, o PS subiria para 14, o JPP manteria cinco, o Chega baixaria para três, os mesmos da IL (que actualmente tem um), e PCP elegeria um parlamentar. O resultado significaria a redução de nove para seis partidos e as saídas de CDS, PAN e BE.

"Não sabemos se é a figura de Albuquerque que acolhe essa validação junto do eleitorado ou se é o PSD. O próprio PS não se constitui como alternativa e quando não há alternativa a validação do eleitorado é pelo partido que está no poder", assinala Teresa Ruel. A professora universitária avisa que pode existir a percepção de que o caso envolvendo o presidente do governo regional ficou "resolvido" devido à libertação dos arguidos detidos.

Ainda assim, as divisões internas nos sociais-democratas ameaçam condicionar a liderança do homem que governa a Madeira desde 2015. Albuquerque voltou a ganhar as internas, convocadas com prazos apertados, mas a corrente interna liderada por Manuel António Correia (apoiado por Alberto João Jardim) obteve 45%dos votos e promete fazer-se ouvir publicamente no congresso de 20 e 21 de Abril.

As divisões chegaram ao governo regional, com exonerações de cargos públicos na Secretaria da Agricultura de apoiantes de Manuel António Correia, notícia que marca a actualidade regional por estes dias. Antes das internas, um discurso de Albuquerque a criticar o carácter de algumas pessoas no interior do executivo foi interpretado como um recado aos apoiantes do seu opositor. "Há pessoas que não têm memória por excesso de ambição, outras vezes porque não têm consideração com o passado, portanto têm um problema de carácter", atirou então Albuquerque, que já se veio desresponsabilizar das exonerações.

No PS, surgiu um movimento de reflexão interno, crítico do rumo do partido, designado por Autonomia 24. A corrente é liderada pelo anterior líder Carlos Pereira (uma espécie de eterno rival de Cafôfo) e conta com o ex-presidente da Câmara do Funchal Miguel Silva Gouveia, e Liliana Rodrigues, antiga eurodeputada. Paulo Cafôfo, eleito em Dezembro, já veio criticar a falta de coragem dos opositores: "Estar a falar demasiado de questões internas quando essas pessoas não têm coragem de se apresentar a eleições, nem coragem de se apresentarem em campanhas eleitorais ou eventos do partido, é fazer um jogo que só vai beneficiar o adversário". Partidos divididos e candidatos repetidos: está dado o mote para as regionais da Madeira.

Calendário eleitoral

De 28 Março a 26 Maio: suspensão do recenseamento eleitoral

15 de Abril: data-limite para a entrega das listas

16 de Abril: sorteio da ordem das listas no boletim de voto

Até 10 de Maio: publicação definitiva das listas

Até 6 de ;aio: requisição do voto antecipado

17 de Maio: votação dos estudantes no município do estabelecimento de ensino

De 14 a 16 de Maio: votação dos deslocados no estrangeiro

De 12 a 24 de Maio: campanha eleitoral

25 de Maio: dia de reflexão (Publico, texto do jornalista Rui Pedro Paiva)

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